Prof. Dr. HC João Bosco Botelho
Ao aceitarmos a pós-modernidade, como sugere Jean‑François Lyotard, moldada no desencanto aos metarrelatos universalizantes, será inevitável o repensar o enquadramento metafísico de palavras‑sentimentos: “razão”, “sujeito”, “totalidade”, “verdade” e “progresso”.
Por essa razão, não existe mais lugar para os super-heróis com as super-propostas.
Se as sociedades continuarem seguindo o mesmo curso na ciência e na tecnologia, as relações de conhecimento, incluindo, especialmente, as éticas, ficarão entre o antagonismo entre dois outros mundos: o desenvolvido e os em desenvolvimento, separados pela produção tecnológica, oriunda do trabalho sistematizado nos laboratórios de pesquisa.
Se abordarmos a pós-modernidade da Medicina sob esse enfoque técnico‑científico, veremos com transparência que o pilar sustentador está fincado na aquisição de um saber ‑ a engenharia genética ‑ vendido ou negado pelos países em desenvolvimento de acordo com as conveniências político‑econômicas.
A condição pós‑moderna, resultante dessas pesquisas de ponta, obrigou a completa reformulação dos antigos conceitos em relação à saúde e a doença, aceitos desde o aparecimento da micrologia no século 17, atingindo diretamente os processos éticos.
Nesse complexo conjunto, a Medicina dos países desenvolvidos se afastou da classificação morfológica das doenças e esta utilizando a engenharia genética na busca de soluções para os problemas de saúde, entre outras, câncer, doenças degenerativas e o envelhecimento.
A Medicina do subdesenvolvimento, ainda continua empenhada, com muita dificuldade, no estudo da morfologia celular, sempre alterada pela desnutrição crônica e pelas doenças infecto contagiosas que dizimam de milhões de crianças por ano.
A Medicina é na atualidade um grande trem caminhando velozmente em direção dos laboratórios de estudo do genoma humano, com a saúde sendo conduzida para a intimidade da estrutura molecular dos genes.
As notícias sobre a engenharia genética são cada vez mais frequentes e completas, fazendo com que o tema entre nas casas como o anúncio de qualquer outro produto de consumo. A mídia mostra com grande destaque uma grande colheita de grãos ou a cura de certa doença, antes não imaginadas, tudo graças às pesquisas reveladoras dos segredos dos genes.
Hoje, mais do que nunca, é imperativo o repensar dos pressupostos teóricos da Medicina nesse novo contexto, mais especificamente depois da publicação dos trabalhos do pesquisador Susumu Tonegawa, ganhador do Nobel da Medicina de 1987, esclarecendo muitas dúvidas de como se efetiva a defesa interna do corpo frente aos microorganismos patogênicos. Ficou demonstrado que quando os linfócitos B se desenvolvem, segmentos do seu material gênico são selecionados e misturados para fornecer novos genes, dando origem a milhões de sequências variadas, capazes de iniciar a luta contra muitas doenças.
Graças aos novos conhecimentos, é possível afirmar que parte da estrutura genética humana é plástica capaz de desenvolver muitas combinações gênicas adaptativas às necessidades da vida. Para que esse mecanismo biológico ocorra na sua plenitude é indispensável, entre outros fatores, que o corpo disponha de uma quota mínima da sua fonte de energia ‑ o alimento.
A partir dessa certeza, ficou fácil demonstrar o que já faz parte, após milhares de anos, do conhecimento historicamente acumulado: as pessoas não alimentadas com uma quantidade mínima de calorias, jamais terão competência imunológica suficiente para enfrentar a maioria das doenças.
A partir dessa abordagem pós‑moderna na Medicina, caíram todos os pressupostos étnicos racistas, diferenciando grupos sociais mais inteligentes e mais fortes do que outros, sempre lembrados pelos interesses dos grupos dominantes.
O processo histórico reafirma a necessidade de a Ética da Medicina do presente e do futuro e o Direito estarem sempre ao lado e na defesa intransigente da dignidade física e psicológica de todos os seres humanos e próxima dos bons resultados, do bom, do belo e do justo.